Thursday, September 07, 2006

Múrmurio

Os braços estão abertos, e girando em círculos
Ambos de mãos dadas, jogam a sorte em dados viciados
Trocam-se de desejos e risos no meio da mesma cantiga
Da mesma canção sem refrão nem verso
É só murmúrio
Que murmura em notas o que nem sente

Lá se vão
Ele diz: "apesar dos outros, serei eu mesmo"
Enxuga a face dele, acaricia a face dela
É de manhã, e é isso apenas o que ele tem
Um bloco de palavras para divdir com o resto do mundo e do sempre
Ou do nada
Tudo

a letra seca, áspera, risca na saliva a página
virada, vidrada, cortada, sangra
a página amassada, orelhas surdas
o canto mudo que não sai, a busca do cego pelo belo
"é belo o meu cantar é belo meu cantar é belo meu cantar"
orelhas ampultadas, palavras afiadas, espinho encravado
espinha encravada, no peito, no rosto, no pedaço da página
amassada, a letra seca e Áspera

que murmura em notas o que nem se sente

Lá se vão
Ele diz: "apesar de mim, serei os outros
apesar de mim... serei eu mesmo"
O bloco de notas se aproxima do fim
O lápis mastigado sangra sua última palavra
Que teima em não escorrer para o rodapé da página

*borrão*

"Estamos tão perto de casa, daqui vejo a nossa janela"
As mãos dadas, voltam a girar e a cantar
Ela limpa o rosto dele borrado pelo borralho da sargeta
(ambos se banham do mesmo sereno)
Ainda não é chegada a hora de parar de murmurar a vida
dos que nem sentem o que é ser alguma coisa
Continua o canto teimoso: "é hora de ser feliz..."

*borrão*