Sunday, July 22, 2007

Dos Passos

Dos dias contados, é, já tinha certeza

Da inacessibilidade dos fatos estava ciente

Da carta, cuja rubrica torta e borrada reconheceria de cara
Tinha receio

Do que ficaria pálido e amarelo, como carne morta,
decompondo-se entre os dentes que então apodreceriam...
Sim, já estava à espera...

e

Da porta batendo, socando meu tímpano, tingindo o suor,
a lágrima, o nanquim do céu estrelado que eu traçara naquela... dia
Acostumei-me

Da voz, que sempre repetia mantras, ah, que dentre certos e errados
Quase certezas de salvações eternas, chamas gloriosas, eu me ria por tanta suposta exatidão
Deflagrei-me

Dos passos, dados, repassados, da varanda, à porta, do tapete rubro
ao altar, da porta ao guichê da rodoviária vazia de madrugada, do Passeio Público chuvoso à ponte interditada,
...eu já tinha o número certo

E das palavras, do 'como está?', ao 'talvez', do 'o que faremos hoje', ao.. ao
...ao 'que tal nos atarmos por entre os trilhos do trem', do 'eu quero você aqui agora', ao 'me diz
3 coisas que te infernizam, porque as quero saber de cor', do '...' ao '...';
...eu perdi até o medo de repetir para mim mesmo quando não estivesse pensando em

Saturday, July 14, 2007

Depois do 'Zê' vem o quê?

Zigoto fecundado, 9 meses se foram, e me cuspiram pra fora do útero e eu
zunia de tanto gemer, chorar, tossir e vomitar na terra da garoa, por isso
zarpei de navio, digo, ônibus, mas balançava como tal, para cidade maravilhosa
ziguezagueando, tropeçando, retalhando joelho, enfim andei, falei, resmunguei e de
zíper escancarado, ri de mim, tinha 15, pensava, resmungava, e, marmanjo, até pra
zona me chamavam, e nem ia, romântico bobo, cheio de grilos, tanto que pra uma
zinha me ‘xonei, me fudi, c'est la vie: fugi de tudo me refugiando no rock n' roll e o
zepelim, minha nova paixão, trouxe a música, abriu caminho pra arte, e revelou o
zênite meu que eu não esperava: A VIDA - finalmente minha tribo era eu e hoje,
zoomorfo, vago de pombo, cagando e voando para tudo o que eu pensava pensar.

--

Texto que mandei pro concurso "Lado Z", promovido pelo site do cantor de mpb (que amo, aliás) Zeca Baleiro. Tudo ia muito bem até eu me dar conta que o prazo do resultado seria curto demais, e que muito provavelmente isso tudo não passaria de um sorteio. Ler textos vencedores que fugiam das regras principais propostas a princípio apenas confirmaram a minha suspeita. Enfim, viva ao Senhor Baleiro, de quem sempre serei fã. *Sorrindo*

=)


Monday, July 09, 2007

'Tarde

...quando você tenta ser perfeito e isso por si só é imperfeição, vê? Devíamos nos habituar a ver as coisas partindo com todos os defeitos como referencial. Olha a ponta do meu dedo, ela está torta, e a unha mal aparada, e dou a mínima. Eu risco o vidro embaçado, soco-o, trinco-o, e o sangue da minha mão cortada esvai, vaza pelo punho trancafiado, tinge o chão de rubro, e aí? A dor ecoa, eu sei, a dor ecoa até seu ouvido pelo meu grito, que sai da minha garganta, que arromba a minha laringe. E você interrompeu sua leitura, porque eu faço sempre barulho demais, e você precisa se concentrar. Mas você tem que entender as minhas necessidades. Eu sei que você está aprendendo a ler agora, ok, ok, ok. É um novo recomeço. Ah, eu estou aqui... Não estou? Seja mais leve, eu te amo, veja bem, tudo passará. Não fique brava.. mas... mas... ah, você está rindo já... HAM... E como estava dizendo, tudo está baseado na imperfeição, e é assim que funciona na prática: o defeito ou o perfeito ilusório, visto que nada é realmente perfeito, são apenas outros dentre outros detalhes. Eu desafino quase sempre, mas e ai, Bob Dylan nunca fui o melhor cantor da galáxia, e é reconhecido pelo o que compôs e interpretou, afinal, e é o conjunto que valeu. As pequenas partes que unidas formam algo realmente belo e que vale a pena. Uma vista furada, um dedo ampultado, uma perna levada pelo caminhão de leite... Defeitos que lá vão ajudar a construir um ser humano melhor! Sim, é isso o que eu acho. É difícil, é foda, no início, ok, só que depois as pessoas superam, vê? E ele o fará! Vai passar a dar muito mais valor a vida, aos apertos de mãos, aos abraços, vai agradecer de poder ainda contemplar o crepúsculo, poder devanear sobre que nuvens tem forma de tigres dente de sabre ou de mamutes congelados no polo norte, ou nem um nem outro. De fato, é melhor assim. E eu sou imperfeito também, e é por isso que acho que superamos isso tão facilmente. "Facilmente", é, entre aspas, sei lá... É, eu sei que nem sempre é assim... Mas realmente devia sê-lo! Veja seu caso: o sol está quente hoje, você pode sentir isso com uma perspectiva diferente da minha. Possivelmente você notará melhor os pássaros cantando mais afinados do que eu, distinguirá as nuances de cada nota que eles solfejem, e seu piano tornará as coisas menos difícieis, visto que você se sentirá mais próxima do que nunca dele. E sua voz, você canta tão melhor que eu, cortará meus timpanos, "will rock" meu labirinto, é lindo demais imaginar. E é você que abrirá as garrafas de refrigerante, sim! Hah! Ou apoiará elas para que eu tire as tampas. Eu não estou tentando tornar as coisas mais facéis... Ou menos dramáticas. E você sabe. E você também sente, ontem a noite deu pra notar. Veja esse lábio, veja esse "cê", eu disse que você sabia. E você sabe que sabe. As coisas não são "ideiais", afinal, pra ninguém. Quando sem limitações, como nós, as pessoas se estressam com pia entupida, com o grão de arroz que ficou caído no chão, e é a Terceira Guerra Mundial, a segunda guerra do Golfo, enfim... Elas se matam todos os dias. E isso é imperfeição também. De uma forma ou de outra... Sei lá. Uma chance pra juntar pequenas imperfeições e torná-las...Não sei. É assim que funciona, você é jovem, e eu também, e estamos bem. Apesar dos pesares, eu posso escrever ainda, com o que me resta, e aqui estou. Em que ponto do livro está agora? Oia, 10 páginas pra acabar! E essa coisa era grande! Isso é lindo demais, querida. Você devia agradecer ao... Como era o nome dele mesmo? Ah, é... Frenti ti ti... Louis Braille, assim que pronuncia? É inglês né? Não, francês... Ok. Haha... Então, você devia agradacer ele cantando aquela canção que você compôs outro dia... Né? Ah, eu sei que ele morreu há quase dois séculos, mas você entendeu, ele pode ouvir mesmo assim, pelo menos eu acredito nisso... E você ainda pode cantar, e tocar piano, e até melhor do que antes, tá, eu já disse isso ...e dentro do que tangimos, faremos extensões de nós, desprenderemos pequenos pedaços do que somos, em cada palavra e cada gesto, porque superamos as coisas, e nos tornamos algo, sem referenciais, algo maior, algo com bases maiores, firmes, alicerses de diamante. É, e diamantes nem são usados em construções. Porque você acha que existem tantos suicidios? A graça é essa, querendo ou não, são nos dadas materias primas ruins e boas, e escolhemos, quaisquer sejam as situações em que nos encontremos. A despeito das situações, eu sei, não sou hipócrita, não é fácil pra qualquer um... mas a despeito das situações, é possível chegar a algum lugar, assim, positivo.Tá, eu tenho que parar com esse papo de auto ajuda, e cada um é cada um... mas não vejo outro forma de expressar o que sinto agora, entende? Tudo bem, não vou lançar um livro baseado nisso, haha, embora não fosse má idéia... Ha! Ok, querida, vou parar de falar, haha! Você que bem que gosta afinal de contas, né, sua sapeca...

...

As coisas não são perfeitas, mesmo, mas acho que outras coisas mais relevantes tornam isso um detalhe de pouca importância... Sei lá o quê. Enfim... Já são meia noite, vamos dormir então? Vamos, pegue minha mão. Ah, e agora me dê um abraço... Ok, agora vamos. Cuidado com a cadeira.