Friday, November 30, 2007


enquanto isso, do lado esquerdo do peito, um bilhete borrado de sei-lá-o-quê dizia: 'aqui jaz um coração'. pouco depois, ao lado, havia um pedaço de guardanapo com gordura e um pós-escrito: 'perder você para a sorte foi meu último passo em falso.'

Wednesday, November 28, 2007

4e2

Era para ser só poro com anis
Dois soluços em um arpejo
Lábio no veneno dedo em foice
Arrepio e convulsão ao tato
Apetece sacia quando hora propícia
Que sejam 15 minutos
Suor duo funde queima
Cospe fumaça em carbono
Bufa arqueja sopra
Guturalmente esgüela
Elaelaelaelaelaela
filho amo puta
te caralho de
O peito pingando
Que sejam 6 minutos e um terço
Vai breu e vem luz
Deixa o cansaço em dia
Pra esquecer que dia

...

Cicatriza selando rompendo
Orloff Lambrusco Heineken
Enxarca pele quase toca
Que sejam 15 segundos e meio
Faz madrugada assim
Quatroquatroquatro números divinos
E dois
Finge se vestir
Cai pela janela
Entra pela portinhola
Se escondem de lençol
Inundam seus corpos de maremotos
E suas almas de silêncio

.

Friday, November 23, 2007


"...queria eu que aquela paz não fizesse esquina com este desespero"

Saturday, November 17, 2007

Azul lá longe

"Realmente me importa saber o que tanto você rabisca aí, nesse canto, esfolando esse papel azul machê,” disparou R., tentando mostrar segurança e incisão em suas palavras. Havia dito em vão, contudo, afinal T. mostrava total desatenção acerca de qualquer coisa que não fosse o citado papel azul. Machê. E arranhava um traço, dois traços, dando a impressão de ser apenas ela um gato revoltado tentando se defender de alguma ameaça. A ameaça, no caso, o papel, que faça-se a verdade, era rabiscado forçada e impetuosamente, a ponto de ser quase atravessado pela ponta de seja-lá-o-quê estava sendo usado para pungir-lhe à tinta.

Pingos azuis e verdes manchavam a mesa quando por instantes T. levantava a folha de papel para observá-la contra luz. De tão rápida e praticamente instintiva forma o movimento se fazia, que visualizar com exatidão do que se tratavam os traços se tornava tarefa impossível. Porém, à uma hora da manhã, cansaço começava a imprimir suas cores na face de T. Faria em pouco tempo cerca de 8 horas que começara o misterioso “ritual”, como R. mesmo afirmava em voz alta. Na verdade... Dentro da sua cabeça. E franzindo a testa ao tentar passar gravidade nesse gesto, esquecendo-se de que nada havia dito em voz alta, e que ela não virava a cabeça para outra posição do cômodo da sala à não ser a direção do papel, no meio da mesa, até então. O seu estado parecia um constante transe que se movia vagarosamente assim como fazem nuvens em formas de elefante ou cegonhas, riscando o céu afora.

R. chegara do trabalho no horário de sempre neste dia. T. parecia ter chegado do seu serviço mais cedo do que de costume, visto que no determinado horário da chegada dele, ela estaria ainda trabalhando. Talvez sequer tivesse saído de casa, reconsideraria ele posteriormente. Quando chegou encontrou-a fitando o papel com a mesma intensidade de agora. Somente pôde supor que começara o ato naquele instante, ou dentro de poucos minutos anteriores a este, após notar dentro de um certo tempo que a pilha de papel amassado jogado sob a mesa, em um canto afastado contra a parede, crescia com certa regularidade e constância, e que quando chegara, apenas havia dois pedaços rasgados em simetria quase perfeita, provavelmente o primeiro rascunho rabiscado e abandonado.

A impressão que a situação marcara em R., e esta seria um outro ponto das coisas que ele depois refletiria, mais frio e impassível, passava a idéia de uma T. correndo contra o tempo, à passos largos, contudo, com saltos de joaninhas. Havia pressa fugaz e desespero em cada traço, sim, mas havia calma evidente onde deveria haver insatisfação e inquietude quando um esboço se mostrava aquém das expectativas, e que era amassado, rasgado e jogado à pilha, junto dos outros pedaços passados. Os traços, curiosamente, difusos e aparentemente aleatórios a princípio, representavam certa ordem lógica após os recomeços dados a cada novo pedaço de papel azul machê pego na pilha, envolta em um embalagem de azul mais escuro, postado ao lado dela. E havia outra questão intrigante na situação, deixando R. realmente apreensivo: a face de T. Ela parecia constantemente virada pra dentro, de uma forma que em momentos passados de sua vida ele jamais poderia imaginar ou visualizar através de quaisquer descrições. Somente ali, ao vivo, isso faria sentido. Que os gestos encenados involuntariamente pela boca, pálpebras, narina e, bem mais discretamente, orelhas, pareciam acenar para um eu lírico invisível, que ele apenas conseguia, ou se atrevia imaginar, ser um espelho abstrato. O espelho abstrato das palavras. Ou das palavras que estão no embrião de formação na mente, que nem chegam a ser palavras de fato, que tem seus sentidos ainda intangíveis pela razão, cheias de figuras oníricas ininteligíveis a compreensão dos demais. Ela parecia observar cautelosamente os traços e os gestos do seu rosto, e isso descrever. Descrever através daquilo que ela rabiscava no papel. Fosse o que fosse. Caía como chocolate quente sob ambos a escuridão da noite.

Além, T. parecia evitar, ignorar suas necessidades físicas. Durante o tempo transcorrido, R. observou que ela ainda não se levantara para ir ao toalete ou para se dirigir a cozinha pegar algo para comer. Assim, ele tomou a iniciativa de extender um prato cheio de frutas cortadas próximo a ela -e foi isso o mais perto que ele chegou dela até aquele instante-. Esperou reações físicas à fatores diferentes ao conteúdo de sua tarefa, sentou-se em um sofá o canto extremo oposto da sala, e voltou a observá-la atentamente. Após um período de horas, notando que pequenos insetos já demonstravam maior interesse em fazer moradia por entre as maçãs e as pêras do que ela em comê-las, retirou o prato, evitando chegar mais perto do que antes, esticando o braço o máximo que podia. Já não tinha esperanças de ouvir sinais de protestos, e assim foi. O silêncio deslizava como a tardinha depois do almoço. Às 3 da manhã, R. apenas continuava a observá-la em sua distância calmamente porque o dia seguinte seria feriado, sem haver risco para qualquer um dos dois de perder horas de sono ou se atrasar para o emprego.

Novamente, R. roía os dentes uns contra os outros quando disse, e dessa vez efetivamente, em voz alta: “Também gostaria de saber até quando você ficará aí. Até quando ficaremos assim?”. Foi a segunda vez que se comunicara verbalmente com ela dentro de um período de 12 horas. E sequer atrevia-se a se levantar, sair do lugar, fazer algo, ou pronunciar outra palavra além daquelas. Parecia que o esforço extremo e derradeiro do seu corpo havia sido dado, e que agora já força alguma restava dentro dele. O último suspiro. Sem açúcar. Em momento nenhum, também, se atreveu a tentar olhar por cima dos ombros dela, ou aproximar-se discretamente por suas costas, evitando fazer barulho, para saciar a dúvida que apetecia-lhe o peito. O que tanto ela rabiscava no papel. O que tanto...

A questão? Ele sabia. A resposta. Chamava de dúvida o que na verdade tinha fobia de formar em sua mente. É. Isso aí. A certeza.

Friday, November 16, 2007

e

u não penso, não posso pensar, não devo pensar, não é recomendável pensar, não queria pensar, posso não pensar, finjo não pensar, não penso, não posso pensar, não devo pensar, não é recomendável pensar, não queria pensar, posso não pensar, finjo não pensar, não penso, não posso pensar, não devo pensar, não é recomendável pensar, não queria pensar, posso não pensar, finjo não pensar, não penso, não posso pensar, não devo pensar, não é recomendável pensar, não queria pensar, posso não pensar, finjo não pensar, não penso, não posso pensar, não devo pensar, não é recomendável pensar, não queria pensar, posso não pensar, finjo não pensar, não penso, não posso pensar, não devo pensar, não é recomendável pensar, não queria pensar, posso não pensar, finjo não pensar, não penso, não posso pensar, não devo pensar, não é recomendável pensar, não queria pensar, posso não pensar, finjo não pensar, não penso, não posso pensar, não devo pensar, não é recomendável pensar, não queria pensar, posso não pensar, finjo não pensar, não penso, não posso pensar, não devo pensar, não é recomendável pensar, não queria pensar, posso não pensar, finjo não pensar, não penso