Tuesday, January 23, 2007

sobre watashi

(aquele que tava com as tripas do avesso, cansado de ver sonhos em forma de souvenirs se despedaçarem e exausto de chegar sempre atrasado e ter de ver o barca furada partir. aquele que, irritado com as mesmas canções tortas e desafinadas gritando alto em seus tímpanos, começou a socar a parede crespa até estourar e sangrar os pulsos. aquele que engoliu o seco, e uma meia dúzia de facas de 2 gumes afiados, fantasiadas de amor-meu-bem-me-ame, disfarçando a agonia de ter que continuar a sorrir, mesmo quando o resto do mundo lhe faz careta e atira-lhe pedras e garrafas de cerveja -vazias-.)

Monday, January 15, 2007

Ela e a Inspiração Dela.

A garotinha queria escrever, sabe? Mas estava sem inspiração. Rabiscava com seu compasso e com a ponta da lapiseira sem ponta a superfície do papel. Rasgava-a, na verdade. Chegava a arranhar a mesa de madeira, até. “Merda!”, pensava, sem censuras. Na verdade, sem ninguém para censurá-la. “Quero escrever! Preciso escrever! Estou morrendo, e não sai uma porra d’uma palavra da minha cabeça!”. A situação deixava a menina inquieta, como vocês podem ver...

O ócio, o mal de nossa geração, e o silêncio, outro mal, mas não só de nossa geração, fazia-a lembrar de seus primeiros poemas. Tortinhos, com rimas óbvias. Porém, dela. Todos dela. Os sentimentozinhos, correndo naquele coraçãozinho, tudinho à flor da pele e alma. Lembrou daquele soneto, seu primeiro, sobre a chuva. Escorria da janela muita água. Do teto, despencavam goteiras. “Ó, a nossa casa era humilde. E eu era tão feliz. Só não sabia. Bosta...” E lá foram os versos... Um, dois... decassílabos! Um par... dois pares... sete pares... Pronto! Lá estava seu primeiro soneto, “Ode À Garoa”. Como ficara orgulhosa de si.

Esta noite, contudo, fedia a óleo. A casa era grande, a porta saia para a Avenida X., e os carros cortavam-na à velocidade do som... ou da luz. Tanto fazia. O cheiro de óleo queimado, do dióxido de carbono espalhado, já começara a entranhar em sua pele. E aquilo “desinspirava” a jovenzinha. Além de lhe encher de dores de cabeça. Queria campos, verdejantes, com vacas a pastar. Esconder-se naquele sítio que a vovó tinha. Queria, também, voltar àquela casa de praia, aonde tinha ido com o ex-marido o verão passado. “As crianças tinham adorado...“.

A cozinha era espaçosa demais. “Eu vou enforcar esse corretor de imóveis. Nunca compre uma casa grande quando você vai se mudar sozinha”. Barulho da água batendo no fundo do copo era companhia dela, das aranhas nos cantos das paredes e das poucas baratas escondidas sob o armário. “Em dias bons, eu comporia uma prosa inteira, simplesmente dissertando sobre o quanto o eco de um ruído idiota numa cozinha pode ser barulhento quando se está sozinha em casa”. Sem perceber, tentou se equilibrar num pé só, fingindo ser Saci. Pulou duas vezes, sem cair. E orgulhou-se, também.

Sentada, novamente, à mesa, ajeitou o abajur, espreitou o bloco de papel, e tomou nota sobre o que acabara de pensar. “Vou dissertar futuramente sobre o eco da cozi...” E de repente rasgou o papel. Tivera uma genial idéia. A inspiração, aparentemente, voltara de supetão. “Vou falar sobre goteiras, isso! O jovem morava no segundo andar de um prédio de 20 andares! E goteiras de chuva caiam no meio da sua sala de estar! E...”. Os carros continuavam passando, como loucos, do outro lado da rua. O cheiro ainda era podre. Para os padrões dela, ao menos. Porém a menina se sentara, puxara, com sede, o papel e lápis, e mergulhara a escrever. Os seus olhos brilhavam tanto, que parecia aquela mesma “Liginha”, que acompanhada de sua excitação, abria a embalagem vermelha, cercada de durex, separando-a de sua tão sonhada boneca da Cinderela... Os olhos brilhavam tanto, que lembravam muito de perto, a mesma “Lí” que acompanhada de sua inquietação, ouvira do namorado as palavras “casar” e “comigo” numa mesma sentença... Brilhavam tanto, que nem parecia a mesma Lígia, acompanhada, agora, apenas de seus 35...

Épico romântico em Liqüidação de queima de estoque:

De graça

Digo que te amo
E me contradigo no verso seguinte
Antes mesmo do poema acabar
Pois não te faço o sentido, nem a cabeça

...Vá se fuder antes que eu me esqueça.

Tuesday, January 09, 2007

Ponto final

bela hora, você escolheu
para se juntar ao circo
e ir embora da cidade
momento ótimo
este
para se juntar as minhas palavras
joga-lás no sentido literal
e ir pro inferno
de vez

outro dia estava eu
sentado na beira da calçada
amarrando em cadarços
sujos
o sonho mais cru
de te ver aqui
pra sempre:
até meus olhos se decomporem
e deles se esbaldarem outros olhos
e de minha boca
que jamais tocará a sua
fazerem festa outras bocas
e por onde eu disse
o que virou pó
em pleno ar
na frente de nós dois

tudo é tão colateral
tudo é tão proporcional
o ódio
seco
que escorre dos lábios molhados do amor
o ciúme
cru
que se espreme
no espaço vazio entre cada linha escrita
ou pulada
dos versos de paixão e paixão

o reflexo irreconhecível no espeplho
é tão tristeza quanto tudo o que dissemos
por termos deixado de dizer tudo

e a poeira
que como sem sal
enquanto comtemplo a
(sua)
carruagem
(uma vez abóbora)
ir embora
pra bem longe
.

Wednesday, January 03, 2007

Ele
















Fim.

O rito de tempos em tempos se repetia, fazendo-se de tolo
Ainda que da ponta dos olhos se pudesse ver
Ele cruzar a esquina, murmurando, de mãos nos bolsos
Aproximando-se, com os relógios parados, com palavras tatuadas
O rito de tempos em tempos se repetia
Encostava-se na porta, ouvindo, de manso, o que diziam do outro lado
O ouvia os ruídos se tornarem cada vez mais intensos
Até a hora que ele chegava, novamente

Ele, em qualquer média definição
Arrastando...se. E eu sabia tão bem o que isso significava

Ah, ele era a moeda jogada no poço sem fundo dos desejos
Era a saudade sutil do que estaria por vir
Ah... ele causava aquelas sílabas, afiadas, ricocheteando dentro da boca
Cada vez mais cortando um pedaço do céu
Que vermelho, avermelhava-se mais
E que de tanto rubro, viria sair, escorrer
Ou cedo, ou tarde, e por todo resto.

Fim.

E então.
E de novo.
Ele, vinha, em riscos e travessias
Em saltos de uma perna só
De anos à fio, fazia
Frases monossilábicas mal trocadas (depois daquele dia)
Abraços retalhadores, segredos pálidos, cometas perdidos e apressados
Arrastando...me. E eu nunca fiz idéia o que isso significava

Porém me diziam... (que ele)
Era o mal que fazia bem
Era a luz que perpetuava, e fazendo mais luz, seus frutos
Era o que havia de novo nascendo após cada brusco escurecer
Era eterno
Era divino
Era cristão
Era amante
Era desejo
Era o fogo que ardia sem doer
Era cego
Era todas as cores numa só
Era... meu (e dela)

Fim.
Que querer, saber, de tropeços e pedaços cortados?
Pele e mão retalhados e cicatrizados pela metade?
Chega: do que disse, faz-se ponto final.
E faz-se sua memória, que aqui, já nada recorda.
Virando esta página e deixando-a para trás.

Fim.














E então...

-xx-








Edit: Foto originalmente publicada no site Olhares pela usuária Ana Red (clique aqui para ver o seu perfil e suas fotografias).