Wednesday, June 28, 2006

Agora. Ontem. Depois.
















Hoje.
Cada palavra podia ser a última.
O amor não passa pela porta entrefechada.
Desatento e com disritmia.
Eu aqui, fecho as mãos mentalmente.
Uma prece caladamente cínica.
Dentro do breu de minhas janelas fechadas.
Busquei alguma ilha.
Do breu que busco aquele mito desbotado e gasto.
Fé.
O resto acaba sendo a sobra do real e virtual.
Eu.
Escrever, encravar, escarrar.
Tanta disritmia nos segundos que conto.
Bastardos ponteiros imprecisos.
Frustrada saliva seca.
Infeliz linha torta do horizonte.
A meia noite chegou mais cedo.
A porta estava fechada.
Não.
Entreaberta.
O amor saiu pela porta entreaberta.
Mas nem vi ele entrar.
Cada palavra foi a última.

Tuesday, June 27, 2006

Tão pouco

Nenhuma razão aparente
O livro caiu com página aberta na cabeceira
As chaves frias caíram no chão
Nenhuma porta foi aberta

De baixo da mesa tem um tiquinho de vaidade que
Devaneia, vizinha de poeiras e rascunhos esquecidos
É, é tanto tudo isso, é tanto em tão pouco
Há tempos que o muito assusta, por isso
Esquecidos e empoeirados verbos e versos
Encolhem-se em sargetas inconscientes

Tudo em tão pouco
Só porque eu esqueci de dar um nome ao que sentia

Nenhum motivo coerente
As páginas picotadas a mão, e então, no cesto
Os olhares pálidos miraram o chão
Nenhuma janela foi aberta
Nenhuma porta foi avistada
Nenhuma campanhia tocada
Nenhum bom dia foi...

"Quer entrar?".

Friday, June 23, 2006

Tédio e Pensamento (Ou tédio até o pensamento; Ou produto interno bruto).

Tô sem nada pra escrever.

Estou até com calos nas pontas dos dedos. Mas, óbvio, nem é de escrever. É de bater na superfície da mesa mesmo. É para atravessar, com som oco e áspero, a indiferença das paredes do meu quarto. Olha só! Escrevi um verso de poema. Vou anotar esse. E mais esse. E aquele ali escondidinho na poeira do meu violão sem cordas. E aquele outro, encolhido na cova do sorriso dela. São versos. Principalmente o são por eu sequer julgá-los próprios para versificar. Só versifico. Nem somo um mais um, e já sei que vai dar três. Não importa porquê. Dá três e pronto. E não discuta com minha teimosia de velho. Sou ranzinza, sim, sim e sim. Pouco me importo. Muito me importo. Já até pensei em tirar esse tapete do quarto. Já até pensei em trocar a roupa de cama. Pensei e pensei. Acho que foi aqui que bateu o problema. Eu pensei! Ó deuses cegos e mancos, eu pensei! EU PENSEI MERDA. Não devia ter pensado. Não devia ter jogado aquela coleção de quadrinhos fora. Não devia ter vendido os meus cd's do Bon Jovi (ou devia?). Não devia ter deixado de agarrar a mão daquela senhorita quando tive a chance. A moça passou, o sinal se abriu. E eu fiquei aqui. Com o tal do pensamento. Mas eu acho que pensamento não se beija. Eu acho que pensamento não se abraça ou apalpa. Eu acho que pensamento não emite cheiro. Insípido, inodoro, incolor. Que nem água. Água lava, porém. Pensamento, nem sempre. Eu fiquei com ele enroscado nas unhas. Tá bem aqui. Eu acho que ainda arrebento uma corda de violão com ele. Intrometido. Teimoso. Analgésico, é verdade. E ainda assim pesado, cru. Pesa fundo no estômago pensar na chuva que passou. Desde que nem gata no cio pela garganta. E chega lá, todo pesado. Demais pra si mesmo. Crente que veio na hora certa iluminar a coisa certa. Acender a luz certa. Ops, tomada errada. Ah. Agora sim, tomada certa. Cadê a lâmpada? Roubaram as lâmpadas da varanda! Onde esse mundo vai parar... Pensando!? De certo que... talvez. Pensei o bastante por alguns instantes. Agora estou me lichando para pensar de novo. Vou tirar férias. Vou esticar as pernas. Vou escrever poemas sem títulos. Sem meio nem fim. Acho que vou demitir o meu patrão. Acho que vou pôr meu pensamento na rua. Só espero que ele saiba atravessa-la. Olha só, olhe dos dois lados viu!?

Ainda tô sem nada pra escrever.
Ok. E...?

Sunday, June 18, 2006

Vagalume






















Um lago
Impassível
Escuro
É noite, e reflexos, e pontos de luz
Desconcentrados e indecisos
Vagueiam na penumbra beira lago.
Sopra o vento um sussurro inquieto
Até intrépido pra uns, talvez
Esbarra n'uns vagalumes desatentos e desacordados
Vazios pelos espaços de suas próprias distâncias
Até que
Acordam
E surpresa!
A noite ainda não clareou-se
'Era cedo ou era tarde?'
'O tempo ainda não definiu-se'
'O fim pode estar começando'
'O início pode estar terminando'
E os vagalumes dispersos e sôfregos
Embaralham-se entre si por um momento
Até acalmarem-se
Nesse purgatório-nanquim-sem-fim
Até então inquietarem-se
Ao notar que o sem-fim é sem fim
Nas palavras e nos atos

Foge fino, 'silêncio'
Um deles, vagalumes
Vagueante vagalume como os outros
Entoteia-se, ao mirar e seguir os próprios passos
Sem pés, sem pernas, sem passos
Contudo, passos
'É um brilho ofuscante este aqui no seio
Aqui vou eu pra algum lugar'
Segue firme
Cambaleante
Firme
Cambaleante
Segue
Sua própria luz o entretêm
Esquece-se do além disso
Os além disso que divagueiam por aí
Esquece-se, contudo, por bem pouco, é verdade
Tempo, pouco tempo
E muitos passos sem passos depois
Vira-se
Não distingue exatamente o que é
O que é?
Não é uma, é a...

Vê a luz, brevemente translúcida
Indiscreta, sem pudor
Movendo-lhe os lábios e as pálpebras
Aquecendo-lhe o peito desavergonhadamente
Acalantamente
Aconchegantemente
Tão incompreensivamente
Que transcedeu o antes intranscendível
.
.
.
Tão incompreensivamente
Que o peito quis fechar
.
.
.
E o fechou por final.

Resolve mirar o lago uma vez
Este, impassivel
Ao contrário da intrigante luz
Nada manisfestava diante do vagalume
Nada
Nada
nada
e
que
mesmo
assim
o mirou de novo e de novo
até decidir enfim
mergulhar
deixar a luz
e sem sequer despedir-se dos amigos de leito
mergulha...

Até que enfim foram embora a noite e o purgatório-nanquim-sem-fim.

Thursday, June 15, 2006

Nós três

Estou fora de casa
Um rosto sem sono escorrega entre as brechas da impassividade mal fingida
E olha que não são poucas
E olha que são mais largas do que parecem

Eu quero me acordar do frio
Eu quero adormecer antes de escurecer
Eu quero me desintegrar com água corrente
(As vitrines já maquiadas de trapo novo nem me comovem
Os manequins suando o fedido encardido nem me convencem
Os pierrots sem lábios e sem dentes nem me assustam mais)

Nós três: olhando para os quatro lados da rua antes de atravessar
Nós três: de braços dados, sem correr, sem tremer, sem enraivecer
Nós três: chutando e quicando nossas vidas não vividas há tempos

Estou fora de casa
Vestindo a máscara que usei carnaval retrasado
Vestindo a perspectiva que sempre tentei usar antes
Mas que não estava a venda

Estou fora de casa
E tudo o que eu quero é acreditar
Que um dia já estive.

Monday, June 12, 2006

Dois nomes sob o sussurro gritado que ainda não se fez ouvir.


Interlúdio


"Canta canta canta,
Nem o desencanto, nem o medo
Canta de dia, ao dia, o dia
A felicidade que chega cedo, cedo, cedo"

Allegro breve
Risos e regojizos
Danças de roda
Rodas sem fortunas
De mãos dadas
Girando girando
Eu caio, tu cais
Ambos cairão
A nuvem passou
Sem dizer adeus

"Vou fazer de conta que estou a pé
Vou engatinhar o caminho de volta
Vou abrir a porta, e fecha-la. Mas não vou entrar em casa
Vou virar as costas.
Vou voltar pra onde ainda não estive
Vou chegar no meu, só meu, só meu, e teu, só teu, só teu... lugar algum.
Eu vou...
Tú vais
(Não vais?)"

Erguem-se aparatosas
Olham-se rápido
Riem riem
D'um entrelace...
Só ninguém entende
Dão as mãos de novo
Giram a roda sem fortuna
Caimos, caíra
A nuvem passará tão crédula
Sem dizer adeus
A cantiga é leve
A dança segue
Risos e desencantos
Dissolvem-se
Misturam-se
Breve alegria
Na infinda dança.

"Canta, canta, canta
A lis de cor esperança
Ali e aqui e agora
Canta, canta, canta
Teus ritos de sabor criança
Aqui e ali e vida afora."


O Adeus Que Sempre Estará Aqui

Eu não vou me rasgar feito um envelope de carta velho
Eu vou é me inspirar depois da meia noite
Tacar meia dúzia de rancores e paixões
Em gritos ensurdecedores gemedores agoniantes
Eu vou é lembrar do adeus de quem sempre estará aqui

Eu não vou me fechar feito um envelope velho de carta não mandada pra ninguém
Eu vou é me respirar, asfixar-me n'um beco, sufoca-la n'aquele rio
Eu vou é enterrar esta cruz de madeira velha mal esculpida
Gritarei a minha desafinez e sem nem um pouco de inocência
Roubar a mão dela
Eu vou é me embora com a mão dela
E com o resto do que restar e não restar também
Eu vou é me embora com ela

Eu não vou me enterrar feito um envelope estancado esquecido escancarado escarrado
Eu vou é expirar, selar, desinterrar, expurgar, anistiar
Vou dizer adeus aos meus 'adeuses' que me rodeiam e assombram
Eu vou é ir me embora sob o som daquela canção
Vou cuspir, vomitar as salutências
Eu vou é falar mais sobre o que nem sei
Sobre candice, sobre bitolice, sobre sandice
E ainda mais e mais sobre que eu sei que penso que sei
Sobre o que eu quis, quero e vou querer
Eu vou é me embora com a mão e o rosto e a boca e a voz e o riso dela
Com a gargalhada, com a afobação, com o repente
Com aquele segundo expremido e apertado e abraçado
Nos braços e nos abraços

E tudo aquilo que restou e não restou
E tudo aquilo que eu disse e não disse e quis dizer mas não disse por ter algo a dizer
E tudo aquilo que eu fiz e desfiz e refiz e desfiz e refiz e faço e faço
E tudo vai assim como está
É que estou tão a flor da pele
Que eu vou mesmo é...
Me rasgar feito um envelope de carta velho
E eu vou rasga-la e lê-la e beber dela também feito um último momento do eterno penúltimo adeus.

Friday, June 09, 2006

Ruas e Ruas




Ando por ruas despavimentadas
Sob os pés dessolados
Respiro um pouco, bem pouco, de ar alheio
Rodeio a desatenção a portas fechadas
Fecho o peito pelo frio
Enquanto carregava de dispersão
As letras costuradas e remendadas, bem aqui
Pois é tão simples dissumular a sinceridade
Tão limpo se sujar com a poeira dos dias
Que as ruas sem fim se multiplicam
E dos sem fim se fazem becos
Sem saída, sem entrada

Só parece ter razão aquele
Que trancou bem, tão bem, as portas antes de sair
Que nem ninguém, nem ele, pode voltar

Só parece estar certa esta despedida
De costas, d'um repente inssoso
Do meio sorrir, do meio cantar

Dos buracos em cada quarteirão
Caí, n'outros tantos
Fiz d'outros prazer
D'outros vexame
Sem nome caminhei
Mas e então?
É hora de fechar o livro
Estender na janela p'ra secar
As letras remendadas e costuradas
O sol bate, e o beco desolhado desmorona
Contudo ainda não sei p'ra onde tudo e nada vai levar.

Friday, June 02, 2006

Compasso perdido

Se me sobrasse inspiração
Eu escrevia uma carta de cem palavras
Sem palavras pra você
Eu atava um laço da minha manhã a tua
Eu talhava setecentos sonetos
Cem para cada vestígio de alegria descompromissada
Que você deixou aqui quando sorriu

Se me sobrasse tempo
Eu corria com um traço só as paredes da casa
Um oceano rosa verde fluorescente
Com o pincel e a tinta suas
Ora mais pálidas, ora mais vivas
Que tanto aparecem e desaparecem nesses desenlaces
E reenlaces

Se me sobrasse assanhamento
Eu ensaiava uns passos desajeitados
Uma valsa em quatro por quatro
Pisava umas cinco vezes nos seus pés
Caia contigo, descompassado
E lhe dava a mão...
Com todo o cinismo de quem ainda faz um favor

Se me sobrasse atenção
Eu recitava só de memória todos os versos
Daquela canção que você tanto canta
Mas que só lembra o refrão

Se me sobrasse alento
Eu jogava pela janela a minha distância
Eu jogava pela janela a minha
Eu jogava pela janela...

Se me sobrasse as horas, e os dias e as estações
Eu parava debaixo daquela árvore
Fingindo ler um livro qualquer
Mas estaria só esperando você passar
Pra lhe dizer 'boa tarde'
Ou nada mesmo

Se me sobrasse mais de mim mesmo
Eu espalhava, pelo ar, tudo num quê sem porquê
Os versos imaturos e indiscretos que sempre escrevi
E riria deles, ao observa-los se debater fora d'água
E sorriria ao ver você rir da mesma forma
Afinal, ainda somos todos uns tolos, burros, ingênuos, que querem viver e ser felizes
Mas fingem que não.

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Ao som de: Inside Out - Pain Of Salvation